terça-feira, novembro 29, 2005

Personagens III

Ele dizia-lhe, a medo:

- Não sei como te pedir isto, mas será que podes agarrar o meu coração, antes de ele cair aos teus pés?

Ela respondia, também com receio :

- Como queres que faça isso?

E ele, quase sem expressão na face, lívida, como sempre, respondeu-lhe :

- Quando te disser OLÁ, não olhes para o lado nem finjas que não estou lá, quando te perguntar as horas, não escondas o relógio nos bolsos, que já conheço todas as tuas calças, quando te perguntar se está tudo bem, não respondas só sim, diz-me o que está mal que eu engulo o meu próprio sangue para te ajudar. Quando te pedir apontamentos daquelas aulas a que não fui, quando te perguntar o que fazes, o que ouves, o que gostas ou mesmo quando fizer silêncio a olhar simplesmente para ti, não demonstres distância, não me digas "bom tenho de ir", não me alvejes os sentimentos e não pintes de negro as minhas estúpidas perguntas. Quando te vejo sinto o coração a bater-me tão violentamente no peito, que até as palavras me fogem da boca. Não te peço que me ames mas talvez, que me reconsideres, guardando-me em ti para sempre que me dirigir à expressão gloriosa dos recantos inabaláveis da tua beleza, mas isto são adjectivos a mais, para quem só te quer amar perdidamente e para todo o sempre.